O Caderno Amarelo #10
Transtorno obsessivo-compulsivo; o colapso do romance; uma conversa à beira-mar.
Essa é uma edição só para colaboradores, que fala sobre criação literária, acompanhando o processo de escrita do meu próximo romance. Se você não é assinante pago, vai encontrar o antipático Paywall em algum momento aí embaixo. Perdão, mas os artistas precisam manter a sua lojinha! Na próxima semana, seguimos com a programação aberta.
Em 3 de janeiro de 2024, inaugurei o caderno de anotações do meu romance. Um velho desenho dos Himalaias na capa, duas das montanhas soltando fogo e novelos de fumaça preta. Faltavam 28 dias para minha mãe morrer, e eu obviamente não tinha ideia do futuro com essa precisão matemática, mas já sentia havia muito tempo a brisa da morte soprar na minha cara, os dias da minha mãe uma progressão rápida de deterioração mental e física, eu acompanhando aquilo em três ou quatro telefonemas diários e longas temporadas em Porto Alegre. Em 3 de janeiro de 2024, escrevi no caderno – a letra sempre mais clara na primeira página de um novo caderno, como se ainda pudéssemos acreditar em beleza, organização e lucidez –, escrevi no tal caderno pequenas notas sobre um livro que eu havia acabado de ler: The man who couldn’t stop, de David Adam.
Naquela altura, eu já estava no meu modo pesquisa. Entrava na Amazon e comprava e-books aleatórios sobre temas que queria explorar. The man who couldn’t stop foi minha primeira leitura sobre transtorno obsessivo-compulsivo, o famoso TOC, possivelmente a doença mental mais ridicularizada dentre todas as doenças mentais, como se se resumisse a hábitos risíveis do tipo não pisar em emendas na calçada ou arrumar quadros tortos na casa de outras pessoas.
E eu sabia que era muito pior do que isso.
Escrevi no caderno coisas que estava vendo sistematizadas pela primeira vez: “três tipos de crenças disfuncionais no desenvolvimento de TOC: 1) senso exagagerado de ameaça e responsabilidade pessoal 2) perfeccionismo e intolerância com a incerteza 3) crença na importância excessiva dos pensamentos e na necessidade de controlá-los.”Também copiei essa citação: “A maioria das pessoas com TOC desenvolve suas compulsões como uma maneira de afastar pensamentos intrusivos.”